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04 - A Noivinha Desencarnada


Caro leitor:
Nesta história estamos apresentando uma aula de Tia Neiva aos Médiuns do Templo do Amanhecer, que trouxe a maior soma de elucidações em torno de nossas relações com o mundo invisível.
A história de Maria Lúcia, a mocinha que morreu devido a uma dose excessiva de drogas, quando ainda envergava seu vestido de noiva é uma história como muitas outras que acontecem todos os dias.
Ela se torna esclarecedora devido à riqueza de detalhes que ela nos consegue transmitir. Esses detalhes irão nos permitir analisar melhor as nossas relações com esse mundo que nos cerca.

É bom que a gente se lembre a priori, que o mundo invisível, o mundo etérico, o Plano, ou melhor, os Planos em que se acham os Espíritos que deixaram o corpo físico, são apenas mundos invisíveis, imperceptíveis aos nossos sentidos e aos nossos instrumentos científicos.
São mundos ou Planos invisíveis, mas são físicos, moleculares e atômicos. São mundos de formas, de sensações, de relacionamento e muito mais povoados do que o nosso mundo físico.
É bom também que a gente saiba que nossas relações com esses mundos não são feitas à nossa revelia, mas, dentro do âmbito de nosso livre arbítrio, presente ou passado.
E é importante também que saiba que o contato com esses Planos se faz através de uma energia física que se chama ectoplasma ou fluído. Essa energia por sua vez é produzida em nosso organismo físico, em nosso corpo. O mecanismo dessa produção e contato se chama Mediunidade e por fim, que todos os seres humanos são Médiuns, pois todos os seres humanos produzem ectoplasma.

 A Noivinha Desencarnada

Um domingo quente de dezembro. No Templo do Amanhecer os Médiuns aguardam pacientes a chegada de Tia Neiva. Os Mestres exortam-nos a se Mediunizarem e se tornarem receptivos à palestra que irá se realizar daí a poucos minutos. A Clarividente chega, toma seu lugar junto ao microfone e o silêncio é completo. Ela os olha sorridente e começa:

Meus filhos, Salve Deus!
Eu nem bem acabara de contar a vocês a história do Sargento recém desencarnado, quando ouvi uma voz chorosa que me chamava no Plano Invisível. Olhei e deparei com uma jovem vestida de noiva que segurava seu buquesinho de flores com ar humilde e constrangido.
Senti que meu coração apertava e solícita, indaguei o que ela queria de mim. Ela me olhou com o ar mais doce deste mundo e me disse:
“Tia Neiva, meu nome é Maria Lúcia e sou um Espírito que teve a felicidade de passar aqui pelo Templo do Amanhecer depois de ter sofrido muito. Apresento-me com meu vestido de noiva porque foi assim que desencarnei. Ouvi a senhora contando a história do Sargento para seus Médiuns e gostaria muito de contar também a minha vida para a senhora e os Médiuns do Vale”.
Olhei para Mãe Yara e ela fez sinal de que consentia. Vi então o quadro de Maria Lúcia e percebi que de fato a história dela iria servir muito para vocês. Então a convidei para vir hoje e ela está aqui do mesmo jeitinho que a vi pela primeira vez: o vestido branco, o véu, o buquesinho e o corpinho esguio. Seu ar reflete um pouco de angústia, mas, seu olhar hoje está firme. Ela está ansiosa para que vocês saibam a história de sua vida. Como vocês não podem vê-la, nem ouvi-la, eu vou contando o que ela me diz. Enquanto isso Mãe Yara vai me ajudando a ilustrar os episódios com sua Doutrina.
Meu nome é Maria Lúcia – diz ela – e eu morava no Rio de Janeiro junto com meu irmão e meus pais. Éramos uma família modesta, mas eu gostava de andar em companhia de jovens de melhor situação. Com isso eu fazia meus pais sofrerem muito, pois vivia exigindo coisas que eles não tinham condições de me proporcionar. Se não conseguia o que queria, saía de casa zangada e pousava fora, em casa de pessoas que às vezes mal conhecia.
Sempre que eles se cansavam desse jogo e deixavam de fazer os meus gostos, meu lar virava um campo de batalha. Eles me proibiam de sair por algum tempo e barravam os meus amigos de entrar em casa. Apesar de se tratar apenas de alguns desajustados como eu, eles eram chamados por meus pais e os vizinhos de “hippies”. Quando isso acontecia eu sofria muito, pois as minhas saídas tinham razões secretas que só eu podia entender. De uma forma ou de outra os meus desatinos os foram levando à miséria. Com isso tivemos que mudar para uma casa pobre, de bairro mais pobre ainda. Pouco antes da mudança eu fui abordada por dois “colegas” já habituados ao meu comportamento e saí com eles. Permaneci fora de casa três dias.
Voltei quando o “fumo” acabou. Entrei sorrindo em desafio.
Na sala deparei com meu mano mais velho, conversando com um amigo seu chamado Marques. Fiquei um pouco indecisa e percebi que meu irmão vacilava em me apresentar; sentia vergonha de mim! Mas, mesmo sem apresentação Marques e eu ficamos nos olhando como se nos conhecêssemos há muito.
Saímos daquele transe com a voz áspera de minha mãe dizendo exaltada: “Oh, sua cínica desavergonhada, o que vem fazer aqui, vem para o enterro de seu pai? Por sua causa ele teve um ataque cardíaco e está entre a vida e a morte!”.
Senti muita vergonha, e pelo olhar constrangido de Marques vi que estava perdendo uma oportunidade de ser feliz.
Meu pai? Foi tudo que pude exclamar e corri para o quarto dele.
Graças a Deus tão pronto ele me viu começou a reagir contra a doença. Com isso me compenetrei que o remédio era eu. Pobre papai, pobre mamãe!
Marques continuou freqüentando minha casa e logo estávamos namorando. Meus pais esperançosos que eu me casasse incentivavam nosso namoro. Mas não foi preciso muito esforço por parte deles. Marques e eu éramos Almas Gêmeas e nos amávamos muito, e assim tudo foi se encaminhando para um enredo feliz.
Estávamos assim na maior felicidade quando os velhos amigos “hippies” começaram a me procurar de novo. Eu, porém me sentia muito feliz com Marques e passei a hostilizar os velhos companheiros de infortúnio. Pensava comigo: eles não passam de uns desajustados com seus pais, eu, porém tenho pais compreensivos e não preciso deles!
Com tudo isso eu me sentia inquieta, não tinha paz. No íntimo eu sabia que meu passado ainda iria me destruir, apesar da atitude que estava tomando.
Como que adivinhando minhas preocupações, Marques sempre me dizia: “O dia que você firmar o “papo” com esses “caras” eu sumo da sua vida!” Com isso minha paz diminuía dia a dia.
Poucos dias antes da data do meu casamento eles intensificaram o assédio. Um dia eles apareceram e estávamos conversando na sala. Eu dizia com veemência que não queria “papo”, que eles fossem embora, que eu ia me casar. Eles apenas sorriam com certo cinismo. Lucas, um jovem de aspecto agressivo, vestindo uma calça de pelúcia e um blusão de couro, passou o braço no meu pescoço e disse: “Que é isso menina? Você está numa de casamento? Tá “doidona”?
Nesse exato momento Marques assomou na soleira da porta! Eu apavorada desvencilhei-me de Lucas e fui ao seu encontro. Ele, porém não me deu tempo para explicações e furioso começou a gritar: “Larguem dela! Vocês já fizeram muito mal a essa pobre menina! Ela agora é minha noiva! Eu sou diferente de vocês, ouviram? Não gosto do “papo” nem de “caras” como vocês!”.
Eles saíram e eu meio desorientada acompanhei-os até a porta.
Voltei para a sala sentindo-me frustrada, com certo desespero, pensando comigo: Lucas e toda essa “patota” são gente boa. Eu não devia ter ficado parada, devia tê-los defendido da ira de Marques. Afinal o que falta a eles é uma oportunidade como a minha!
E assim o conflito começou no meu íntimo. Eu não parava de pensar neles e no que poderia ter acontecido. Cada vez os achava mais “bacanas” e assim em meio à maior confusão, aproximou-se a data do nosso casamento (1).
Um dia eu estava na rua procurando encontrar o meu enxoval quando topei com a “patota”. Procurei mostrar-me cordial, expliquei o que estava fazendo e que iria me casar em poucos dias. Eles, porém me deram uma grande vaia e disseram que não faltariam ao meu casamento. Fiquei apavorada com a algazarra deles, embora soubesse que estavam apenas brincando e não o faziam por mal.
Mais tarde, ao encontrar-me com Marques lembrei-me do incidente e chorei copiosamente no seu ombro. Tinha enorme arrependimento do que fizera e roíam-me os maus presságios. Pensava comigo: Meu Deus será que tenho que pagar pelo que tenho feito aos meus pais?
Nessa noite tive um terrível pesadelo. Me vi diante de uma grande mansão e na companhia dos “hippies”. Lá fora rugia uma tempestade e tinha muito medo. De repente ouvimos fortes batidas na porta. Eu sabia que era Marques, que viera para me buscar, mas não abri a porta.
Acordei gritando apavorada pela minha mãe e ela me acariciando, explicando que eu havia sonhado. Disse-me também que ela e papai já haviam perdoado os meus desatinos.
Desde essa noite minha angústia aumentou.
Minha relação com os “hippies” não era tão simples como parecia.
Em nosso meio prevaleciam os traficantes de drogas, bandidos perigosos que envolviam a gente. Eles se aproveitavam de nossas fraquezas e nosso desligamento com a família servia para incentivar nossos vícios.
O domínio dessa gente é terrível!
Suas vítimas em geral são meninos de bem, pessoas boas, que apenas são desajustados no meio em que vivem, e com isso se tornam presas fáceis para esses malandros (2).
Não contei ao Marques o encontro que tivera com a turma. Sentia medo, mas me mantinha calada.
Um dia estávamos sentados na calçada em frente de casa, quando chegou a turma.
Marques olhou-os friamente como se não os visse.
Eles brincando jocosamente, disseram que tinham vindo me avisar que iriam comparecer ao nosso casamento!
Antes que eu ou Marques pudéssemos dizer alguma coisa, eles já tinham ido.
Marques, visivelmente irritado virou-se para mim e disse: “Se eles aparecerem em nosso casamento, eu vou embora e nunca mais você vai saber notícias minhas!”.
Diante daquela ira eu também me irritei e quase explodi, mas temia chegar ao ponto em que Marques pensasse que estava arrependida de nosso noivado. Mas, aquela cena faltando apenas três dias para o casamento, foi horrível (3).
Afinal chegou o dia almejado!
A cerimônia foi linda, com a igreja toda decorada. Esse Templo ficava num outeiro e o acesso era feito por uma comprida escadaria.
Saímos sorridentes e nem bem emergimos quando deparamos com o grupo em frente à escadaria. Assim que nos viram eles estouraram numa vaia deprimente!
Não pude deixar de registrar quando eles fizeram referência ao meu vestido de noiva, trazendo a dúvida quanto à minha pureza.
Na confusão que se seguiu, sem que nem eu mesma notasse, Marques desapareceu!
Desolada e cheia de vergonha fui levada para a casa de meus pais. Minha mãe tentava me consolar, mas eu estava certa que Marques não tardaria a aparecer. Ela perguntou se eu queria ficar com eles. Eu, porém tentando aparentar uma calma que não tinha, disse-lhe que iria esperar Marques em casa, na nossa casinha! Ele talvez estivesse lá me esperando.
Cheguei ao lar tão sonhado, mas Marques não estava.
Senti então que nada mais me restava neste mundo, além de morrer, porém uma leve esperança ainda alimentava meu coração.
Senti tonteiras e recostando-me num sofá comecei a ter alucinações. Via e ouvia a turma com suas risadas, os rapazes com suas barbas longas a roçarem em meu rosto e suas mãos quentes me acariciando. Invadiu-me estranha volúpia, tão intensa que senti-me impelida a correr para onde eles se achassem naquele momento!
Em meio a essa verdadeira obsessão, permaneci assim meio acordada, meio dormindo, até o dia amanhecer.
Despertei confusa e a primeira coisa que me veio à mente foram as palavras de Marques: “Sumirei de sua vida, nunca mais você me verá!”.
Tomei então uma decisão. Achei em minha bolsa algumas drogas, manipulei uma dosagem e ingeri. Tudo que eu queria era fugir de mim mesma, daquele pesadelo e depois voltar para a casa de meus pais. Sabia que eles me aceitariam, como sempre me aceitaram. Confiava a tal ponto na paciência deles que chegava a pensar ser melhor voltar para eles do que o retorno de Marques. Ele com certeza iria me maltratar, enquanto que meus pais nunca fariam tal coisa.
Engoli as drogas pensando nisso, sem nenhuma intenção de morrer.
Oh! Foi horrível! Comecei logo a “viajar”, porém percebi logo que essa era completamente diferente das minhas costumeiras “viagens”.
Cheguei a uma cidade escura e deserta. Apavorada procurei por alguém que pudesse me orientar, quando subitamente centenas de sinos começaram a tocar. Eram sinos de todos os tamanhos, de diferentes sons que tangiam adoidados! Minha cabeça já estava a ponto de estourar, quando vi um homem vestido de romano antigo que se aproximava de mim.
Seu olhar era bondoso, ele disse chamar-se Januário e que estava ali para me ajudar. Pegou em minha mão e me conduziu para uma espécie de praça, cercada por todos os lados. Os sinos haviam parado como por encanto. Sem que se percebesse, Januário desapareceu e eu me senti só, completamente só.
O que eu pensara ser uma praça, era na verdade um bosque de relva verde escura e árvores simétricas.
Naquela terrível solidão comecei a sentir uma sensação de arrependimento, de coisas que fizera e outras que deixara de fazer. Não pensava na morte, nem na vida eterna. Para mim tudo não passava de um sonho, um pesadelo, uma péssima viagem!
Só uma coisa era constante em meu íntimo: a terrível ânsia de voltar para a casa de meus pais. Mesmo Marques parecia diluído como uma doce recordação (4).
Eu não tinha religião nem sentimento religioso. Só pensava em voltar e enfrentar as minhas dificuldades e ficar à mercê de meu destino.
Saí de meu transe, com o som de uma voz que parecia sair do ar e me cercava de todos os lados. A voz era firme e máscula, mas tinha também um tom melodioso.
Dizia ela: “Preparem-se para voltar para a Terra! – Cuidem de controlar suas vibrações, pois não foi normal o que lhes aconteceu. Neste momento vocês se acham na Mansão dos Toxicômanos! Essa passagem que vocês fizeram, deveria ser feita somente daqui a alguns anos, talvez uns vinte ou trinta anos. É por isso que vocês não são Espíritos normais, porque desencarnaram antes do tempo. Mesmo assim vocês não são considerados suicidas. São apenas Espíritos que desencarnaram antes do tempo previsto. É por isso também que sentem essa atração irresistível pela Terra, para seus ambientes costumeiros. E para a Terra vocês terão que ir. Preparem-se para viajar para a Terra!”.
Senti certo alívio quando percebi que ele se dirigia a outros além de mim, e também notei quando ele nos chamava de “Espíritos”. Sem dúvida havia outros iguais a mim!
A partir daí perdi a noção de tempo e de espaço. Meus estados se alternavam entre angústia, saudades, esperanças e desesperos. Mas não conseguia ver ninguém, embora a voz continuasse a falar. As palavras eram sempre diferentes, mas o sentido era o mesmo.
Subitamente percebi que havia mudado de ambiente. Sem que eu soubesse, eu me movera!
O lugar onde me achava agora era uma grande plataforma, uma espécie de rodoviária cheia de luzes opacas, de um lilás que variava em tonalidade. Às vezes as luzes chegavam a parecer roxas, outras quase brancas.
Encontrei novamente Januário e me senti mais segura.
Como fizera da primeira vez que me vira, ele tomou a minha mão e me encaminhou para um edifício enorme. Lá havia muitas pessoas em atitude de espera de condução. Suas roupas eram mais ou menos parecidas e para meu espanto vi que estava vestida de noiva, com buquê e grinalda, do jeitinho que casara!
Nisso ouvi soluços bem perto de mim. Olhei em torno, mas não vi ninguém com aparência de estar chorando. Olhei interrogativamente para Januário e ele deu a entender que também estava ouvindo.
“É a sua mãe que chora” disse ele.
“Minha mãe? E onde é que ela está que não a vejo?”.
“Você não a vê nem entende, como não entendeu os belos sermões que têm sido feitos até agora”.
“Sermões? Não, não estou ouvindo coisa alguma!”.
“Você não ouve porque suas células nervosas foram danificadas pelas drogas que ingeriu. Também as pílulas anticoncepcionais produziram danos no seu sistema nervoso (5)”.
“Meu Deus! disse eu, e agora, o que faço?”.
“Não se preocupe minha filha, logo você terá a oportunidade de acertar seus desajustes. Para isso você será muito ajudada pelo amor que tem pela sua Alma Gêmea”.
Amor, Alma Gêmea; aquela rodoviária, o romano Januário, tudo era tão diferente do que eu sabia e conhecia...
No instante seguinte tudo aquilo havia desaparecido e me vi numa praia que me era familiar. Vi que Januário continuava ao meu lado e sua presença me dava uma sensação de irrealidade. Mas a praia era bem real e eu comecei a olhar em torno, como nos velhos tempos que a freqüentara.
Minha atenção foi despertada por um casal que brigava em altas vozes. Olhei para Januário e ele me disse: “Vá e procure apartar essa briga, tente ajudar esse casal e é possível que isso vá ajuda-la”.
Eu me aproximei do casal briguento no justo momento em que o homem dava violenta bofetada na mulher. Ela caiu para trás e eu tentei segura-la. Entretanto atravessou meu corpo como se eu não existisse e fiquei ali abobalhada, olhando a mulher caída sem saber o que fazer.
Comecei a sentir grande sensação de culpa, como se eu fosse uma criminosa, uma agressora. O homem que agredira estava com a respiração ofegante e tinha os olhos injetados. Uma pequena multidão se formou em torno e eu fiquei apavorada. Queria apelar para Januário, mas ele havia desaparecido!
O incidente entretanto tornou-me sóbria e com isso comecei a me compenetrar da verdadeira situação. Minha cabeça, porém ainda não se firmava e os pensamentos rodopiavam. Lembrei-me de Lucas com quem estivera muitas vezes naquela praia e saí perambulando, conforme caprichos de minha mente atribulada. Logo percebi que estava fazendo o que sempre fizera: na hora da angústia eu corria para junto de meus pais!
Senti então certa lucidez, uma certeza no coração. Sim, voltava para a casa que sempre me acolheu, apesar de meus desatinos. Só meus pais tinham paciência comigo. Apressei o passo e em pouco tempo estava em casa.
A primeira coisa que ouvi foram as palavras de minha mãe que dizia: “Foi melhor assim, minha filha não podia ser feliz. Ela nunca deixou de tomar aquelas drogas terríveis”.
Gritei então com todas as minhas forças: “Estou aqui, não vou sair mais, não tomo mais drogas!” – mas foi em vão, ela não me ouvia!
Permaneci ali durante três longos anos. Acompanhava meus pais a todos os lugares onde iam, sentava na mesa com eles, entrava nas conduções e ficava magoada quando não sobrava lugar para mim.
Às vezes meus pais baixavam até o meu Plano, em seus Transportes enquanto dormiam. Embora com certa dificuldade eu conversava com eles. Foi assim que soube que Marques havia se casado e que estava muito feliz. Mesmo assim sofri muito com isso (6).
Eu vivia numa atmosfera lilás e muito diferente deles. Não percebia e não entendia muito do que se passava. Mas estava em casa e isso era tudo o que eu queria (7).
Um dia eles decidiram tirar umas férias e viajar até Brasília. Como de costume eu os acompanhei e graças ao trabalho de Januário e outros Mentores, eles receberam um convite e vieram ao Vale do Amanhecer.
Embora vendo e sentindo tudo nebulosamente, conseguia perceber o que se passava no Templo. Via aquela multidão e não distinguia muito quem era desencarnado ou não.
Meus pais esperaram muito tempo, mas por fim chegaram diante da senhora, Tia Neiva. A senhora explicou a eles o que se passava comigo e enquanto conversava com eles falava também comigo. Nunca pude esquecer a doçura de seus olhos e o grande desejo de me redimir, que invadiu meu coração.
A entrevista chegou ao fim e ouvi quando a senhora tocou uma campainha e um jovem chamado Batista atendeu. A senhora pediu a ele que fizesse um trabalho especial para meus pais e ele os levou ao trabalho de desobsessão, nos “Tronos” dos Pretos Velhos. A senhora fez um sinal para mim e eu os acompanhei. Enquanto meu pai esperava, minha mãe sentou-se num daqueles “Tronos”. Não sei se ouvi alguém do meu Plano dizer, mas o fato é que fiquei sabendo que o nome dos Médiuns eram Waldeck, o Doutrinador e Flauzíria, a Apará.
Senti-me atraída pela Doutrina que estava sendo feita e uma sensação diferente invadiu-me toda. Senti que flutuava e vi que estava sendo carregada numa espécie de lençol alvo, que mais parecia um colchão de nuvens. As últimas palavras que ouvi foram do Waldeck fazendo minha entrega aos Mentores.
Senti que me desintegrava num Plano e me reintegrava noutro. Passara pelo “Portal de Desintegração” e já estava em outro Plano! Despertei num mundo diferente, iluminado por luzes opacas e de cores variáveis.
Fui então levada para o “Sono Cultural”, uma espécie de sonoterapia de desassimilação. Despertei sem saber quanto tempo havia passado. Ao meu lado estava Januário com sua roupa romana antiga. Ele sorriu e a primeira coisa que fez foi convidar-me a visitar os meus pais no Plano da Terra.
Encontrei-os vivendo felizes e embora um pouco tristes, a memória da filha desencarnada já não era tão penosa. Eles agora sabiam da verdade e que eu estava em boas mãos. A visita ao Vale do Amanhecer modificara sua sintonia e sua maneira de ver a vida. Agora Tia Neiva, eu voltei aqui porque dentro de pouco tempo vou estar em condições de ajudar os jovens que sofrem os desatinos que eu sofri. Quero ajudar os meus companheiros de desdita. Farei tudo para que eles também possam encontrar suas Almas Gêmeas e aprendam a amar (8).
Peço Tia, que transmita aos seus Médiuns, que devem aprender a perdoar seus filhos e serem pacientes com eles, como fizeram os meus pais comigo. Se não fosse o amor e a tolerância deles eu não estaria aqui agora. É preciso que seus filhos não sintam medo nunca! Se eu não tivesse tido certeza do perdão dos meus pais, nunca teria voltado para casa. Teria sido vítima dos Bandidos do Espaço ou talvez tivesse me tornado obsessora dos meus antigos companheiros.
Salve Deus Tia, e recomende aos seus Médiuns para que contem a minha história para todos que puderem. Agradeça aos dois Médiuns que me atenderam com tanta generosidade.
Salve Deus!

Com carinho,
A Mãe em Cristo.


Notas do Texto
(1)    O conflito de Maria Lúcia tornou-se mais intenso a partir da grosseria feita por Marques ao Lucas. Ela tentou egoisticamente viver outra vida, libertar-se da vida irregular pela adesão ao padrão equilibrado de Marques e o desprezo pelos outros. Entretanto essa lógica é apenas aparente. As coisas de que ela queria se livrar existiam “dentro” dela e os antigos companheiros eram apenas os circunstantes.
Não existe libertação enquanto a pessoa não esclarece os “porquês”, não enfrente com coragem os próprios defeitos e principalmente não os esconda de si mesma. Ao fazer isso, é perfeitamente natural que haja quedas e recomeços, mas é preciso demolir os alicerces, pois como diz Pai Seta Branca numa de suas Mensagens: “O homem não constrói sobre os seus próprios escombros”.
Por outro lado, embora fosse conveniente para ela abandonar a vida que levava ao lado dos antigos companheiros, nem por isso precisava abandona-los e alimentar a intransigência do noivo em relação a eles.
Diz o Mestre Jesus: “Se alguém lhe pedir que caminhe com ele uma légua, caminhe duas... Se alguém lhe pedir a blusa, dá-lhe também a camisa. Se alguém chorar, chore com ele... Se alguém rir, ria com ele...”.

(2)    Os traficantes de drogas são elementos perigosos que jogam com as fraquezas humanas. A geração de nossos dias, os meninos de hoje em sua grande maioria, são Espíritos que foram encarnados durante o último conflito mundial, a guerra de 39 a 45. A conseqüência disso é que eles não passaram tempo suficiente no “Sono Cultural”, não desassimilaram a vivência terrível dessa queda civilizatória da Humanidade.
O resultado disso é que nasceram já aversos aos valores de nossa civilização, principalmente em nosso país. No Brasil existe uma mescla civilizatória em que a maioria dos valores são importados e, no seu íntimo esses Espíritos “sabem” disso e não aceitam.
Graças a Deus nosso país já está formando seu próprio conceito civilizatório, seu próprio conjunto de valores. Mas enquanto isso não acontece em sua totalidade é preciso ter muita paciência e tolerância com as novas gerações. Seu anseio de autodestruição é apenas superficial. Se nós lhes dermos algo sólido para se agarrar eles o fazem de bom grado. Para mudar esses meninos é preciso antes mudarmos a nós mesmos.

(3)    Marques tinha o orgulho do “certinho”. O simples fato de não estar envolvido nas mazelas em que os outros estavam, resultou na personalização de um conceito de superioridade. Entretanto, havia mais perdão no coração daqueles meninos desavisados do que no seu...

(4)    Essa é uma faceta interessante do problema do uso das drogas alucinógenas. Misturado o problema com a mística e buscando-se informações duvidosas no passado iniciático da Humanidade, criou-se o problema das “viagens”, resultante talvez da vontade de libertação dos Espíritos da penosa situação de encarnados.
Na verdade o Espírito encarnado sempre viajou por processos naturais que nunca contrariaram as Leis Universais. Um desses processos é o sono natural, biológico.
Outra forma de “viajar” é através dos Processos Mediúnicos, nos quais a gente pode distinguir com os devidos cuidados o “Transporte” e o “Desdobramento”. Tais práticas, porém são difíceis e exigem condições Mediúnicas especiais. Naturalmente exigem variações nesses métodos, porém nunca estão afastados da idéia de excepcionalidade – não são coisas feitas comumente por qualquer pessoa.
Nada disso existe nas “viagens” feitas com auxílio de drogas. Nelas há apenas a alucinação da mente concreta, do sistema cerebral e, na qual a memória desempenha o maior papel. O Espírito não vai a lugar algum, mas a mente mergulha nos seus escaninhos complexos, desgovernada pelo desequilíbrio que a droga provoca no sistema enzimático.
Por um raciocínio lógico, sempre que a mente entra em desequilíbrio, o Espírito, ao contrário do que possa parecer, não se afasta do conjunto corpo-alma, para que não se percam. É como um motorista cujo carro se descontrola na estrada. Seu motorista faz tudo que estiver ao seu alcance para retomar o controle. Agora, se o carro vai mesmo bater e o motorista puder saltar, ele o faz mesmo. Muitos desencarnes prematuros se devem ao uso de drogas. Antes que o Espírito corra o risco de se perder, ele abandona o corpo. Assim procedendo o prejuízo tem possibilidades de ser menor...
O problema, porém, não termina com a morte física. O sistema nervoso desencarna, isto é, desliga-se do corpo físico, deixando junto com esse corpo as fibras e outras composições celulares do “sistema”. Com a morte do corpo desaparece a distribuição nervosa alimentadora dos sentidos. Mas a parte do sistema que segue com o Espírito, vão alimentar os processos sensoriais no Plano para onde o Espírito segue.
Um Espírito desencarnado, enquanto não chega à realização plena junto a Deus, continua possuindo uma alma, uma “Psique” em torno da qual se forma um corpo etérico. Conforme as circunstâncias esse corpo pode ser uma réplica do corpo deixado. O mesmo acontece com as roupas, os acessórios, etc.
Essa é a razão pela qual nossa Noivinha teve que passar por aqueles trâmites terapêuticos, uma espécie de psicoterapia sideral. Os sinos que ela ouvia eram formas de sacudir a sua mente e traze-la ao equilíbrio. O mesmo aconteceu quando Januário sugeriu que ela interviesse na briga do casal. O choque de sua participação contribuiu para a volta à certa sobriedade da sua razão.

(5)    A célula nervosa não se recupera como as outras células de nosso corpo. O maior perigo das drogas alucinógenas, principalmente o álcool e a heroína, é justamente esse da destruição celular. Pela citação do Mentor Januário, a gente deduz que as drogas anticoncepcionais também devem causar danos semelhantes, pois atuam no mais sofisticado mecanismo humano que é o da reprodução...

(6)    A situação de um Espírito depois do desencarne, varia conforme a vida que viveu. Num desencarne chamado com as devidas reservas, de “normal”, o Espírito passa pelas exigências de seu estado e depois “toma uma decisão”, conforme o grau de livre arbítrio que conserva nesse período traumático. Dentre os vários caminhos “escolhidos” ele pode ficar na Terra, numa espécie de parasitismo dos encarnados.
No caso da Noivinha, dado seu desencarne prematuro, ela teve que permanecer três anos junto aos pais. Essa situação foi muito dolorosa para Maria Lúcia. Embora ela estivesse na Terra, na casa dos pais, ela pertencia a outro Plano, inferior ao dos genitores.
Em seu Plano ela ouvia, mas não via. O Espírito desencarnado não tem o sistema sensorial do encarnado. Ele não vê a luz do sol e na verdade nem a luz de fogo ou elétrica. Seu mundo é embaçado, opaco.
Os mentores permitiram a presença de Maria Lúcia junto aos pais, porque o amor que eles tinham e a paciência possibilitava a evolução dela. Mas depois de três anos ela já estava começando a ser nociva para eles e o que era pior, ela já não estava resistindo às investidas dos Bandidos do Espaço. Esses são Espíritos também chamados de “caçadores”, que servem os Exús. Saem à busca de Espíritos errantes e os escravizam, obrigando-os a participar das suas vidas negativas.
A permanência de um Espírito sofredor numa casa, quando essa casa tem alguma vida espiritual, é sempre vigiada pelos Mentores. Às vezes eles afastam o Sofredor quando se torna preciso e depois deixando retornar. É uma vida humilhante.
Maria Lúcia acabou sendo amparada por Januário. Esse Espírito laborioso, nesse tempo vivia sua roupagem de romano, daí os seus trajes. Ele fora um Doutrinador Iniciado no Templo do Amanhecer e por isso promoveu a ida dos pais de Maria Lúcia para lá. Ele tinha afinidade espiritual com ela.

(7)    Sempre que um Espírito desses, que cometem desatinos devido às condições difíceis da encarnação e depois conseguem se redimir, compreendem o que lhes aconteceu e se dispõe a se evoluir, os Mentores lhes dão oportunidade de trabalhar junto às pessoas que passam pelos mesmos problemas. Com isso eles conseguem os Bônus Horas necessários.

(8)    Como explicamos acima, o Plano de Maria Lúcia era inferior ao dos pais. “Plano” nesse caso significa o grau evolutivo. Às vezes os pais, tocados pela saudade, procuravam por ela enquanto dormiam e, para isso tinham que descer até o Plano dela.

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